Os Killies.

 

Os killies pertencem à Família dos Ciprinidontídeos (Cyprinodontidae) ou "carpas dentadas". O seu nome deriva da palavra flamenga "kil", usada pelos emigrantes holandeses que colonizaram a costa este dos Estados Unidos no século XVI para a designação de pequeno riacho. Os pequenos peixes que habitavam tais riachos eram conhecidos por "kil-vissen", entre os quais se encontrava o ciprinidontídeo Fundulus heteroclitus, o qual surpreendentemente habita também águas do sapal de Castro Marim, em Portugal, a milhares de quilómetros de distância, sem que se saiba explicar a origem do "nosso" killie" nas nossas águas! O que é facto é que a American Killifish Association (AKA) adoptou a designação "killifish" ou "killie" logo após a sua formação, no princípio da década de 60, tendo sido seguidos pela associação inglesa (British Killifish Association-BKA) em 1968, pela associação alemã em 1969 e pelas restantes associações por todo o mundo incluindo a nossa (Associação Portuguesa de Killifilía-APK) fundada em 1998.

Em relação aos killies conhecem-se até à data algumas dezenas de géneros, algumas centenas de espécies e muitos milhares de subespécies, variedades e localizações. Habitam todos os continentes à excepção da Oceânia. A descrição detalhada das diferentes espécies e a sua distribuição geográfica, habitat e comportamento, assim como a sua manutenção em aquário e reprodução é tema para muitos artigos dada a heterogeneidade desta família. Sem cair em generalizações perigosas, serão abordados aqui alguns aspectos que nos permitam entrar no mundo destes peixes coloridos e fascinantes.

Nas lojas de aquarofilia, não é habitual encontrar killies à venda, à excepção dos Aphyosemion australe, Aphyosemion gardneri, Aphyosemion sjoestedti e esporadicamente outras espécies. A melhor forma de obter killies ou ovos é através do intercambio entre aficionados de todas as partes do mundo, através de associações de killifilía e através de exposições organizadas para o efeito. A seguir serão apresentados os géneros mais importantes entre os killies e algumas das suas características:

 

Aphyosemion- É um dos géneros mais populares entre os aquaroflistas pela beleza dos peixes e pela relativa robustez e facilidade de reprodução. Vivem na África ocidental com biótopos muito variados que vão dos ribeiros de densa floresta equatorial próximos do mar, onde a luz do sol tem grandes dificuldades em penetrar à savana do interior, mais quente e seca, com uma zona intermédia ou de transição. São geralmente peixes não anuais, isto é, vivem em biótopos onde geralmente a água não chega a secar na estação seca, se esta existir, o que significa que, se estes peixes forem mantidos nas condições adequadas, se forem evitadas temperaturas elevadas (28ºC ou mais) poder-se-ão manter durante alguns anos. Muitos dos denominados killies fáceis, adequados para principiantes, pertencem a este género, tais como o A. scheeli, A. gardneri, A. australe, A. striatum e A. bitaeniatum. Killies da mesma espécie aparecem frequentemente identificados como pertencentes a diferentes populações ou locais de colheita e podem não ser geneticamente idênticos pelo que não deverão ser cruzados.

 

Cynolebias- São killies anuais que habitam a América do Sul, quer águas temperadas, quer águas tropicais. São geralmente robustos e apresentam um crescimento muito rápido. Neste grupo encontram-se killies muito belos tais como a Cyn. nigripinnis, a Cyn. magnificus e a Cyn. fulminantis, entre outras. Apresentam hábitos de reprodução muito curiosos. Geralmente o macho e a fêmea enterram-se numa camada de turfa de espessura superior ao comprimento do peixe para efectuar a desova. Isso facilita a recolha da turfa para a posterior secagem e armazenamento por parte dos killiófilos. Neste género incluem-se alguns killies adequados para inexperientes tais como a Cyn. nigripinnis e a Cyn. whitei.

 

Epiplatys e Aplocheilus- São peixes não anuais que habitam águas superficiais, geralmente entre plantas flutuantes que lhes servem de refúgio e podem delimitar alguns territórios. O primeiro Género corresponde a killies africanos e o segundo a killies asiáticos. Alimentam-se fundamentalmente de insectos que caem na água e costumam depositar os seus ovos em plantas flutuantes. São fáceis de manter e reproduzir sendo de aconselhar para killiófilos iniciados. Podem ser alimentados com comida em flocos, se necessário.

 

Nothobranchius- São killies anuais provenientes da África Oriental que são considerados entre os peixes de água doce mais belos que existem. Toleram uma grande variedade de tipos de água mas é necessário mantê-la o mais limpa possível. Caso contrário poderá haver uma maior susceptibilidade de aparecimento de Oodinium. Para evitar este flagelo poder-se-á adicionar preventivamente algum sal à água do aquário (aproximadamente 1 colher de sal por cada 5 litros de água). Para principiantes poder-se-á recomendar o N. foerschi e o N. elongatus, entre outros. O N. rachovii é muitas vezes citados como o Nothobranchius mais belo, mas não é dos mais fáceis de manter, para além de não ser extraordinariamente prolífico

 

 

O material indispensável para a manutenção e reprodução da maior parte dos killies é simples e pouco dispendioso. Consiste em aquários de pequenas dimensões (aproximadamente 10 litros podem ser suficientes para um casal ou trio) que facilitem a manipulação e limpeza. O filtro de fundo e areão/cascalho podem ser dispensáveis. O aquecedor/termostato também, para muitas espécies, dado que no inverno as temperaturas mínimas registadas nas nossas casas (15-16ºC) durante poucos dias por ano, são-lhes suportáveis. A filtração e arejamento podem ser efectuadas de uma maneira cómoda e barata através de filtros de caixa, alguns com forma triangular que se ajustam comodamente ao canto do aquário, com manifesta economia de espaço e melhor aspecto estético. O enchimento dos filtros de caixa é simples, apesar de depender do tipo de killie e/ou da característica da água que se pretende manter. Uma combinação habitual consiste na aplicação de uma camada de material filtrante, para reter mecanicamente partículas em suspensão, uma camada de anéis cerâmicos para tratamento biológico e uma camada de carvão activado ou turfa para remoção de determinadas substâncias nocivas, cheiros e côr no caso do primeiro e para a acidificação/estabilização das características fisico-químicas da água com produção de ácidos hûmicos e tânicos no caso do segundo. A decoração será concluida com a introdução de alguns troncos submersos e plantas aquáticas que permitam aumentar os locais de protecção para fêmeas e alevins maltratados, além de melhorarem a oxigenação da água. As plantas que se costumam utilizar são resistentes a vários tipos de iluminação e a características físicoquímicas da água bastante diversas. Nesse grupo incluo o musgo de Java, o feto de Java, algumas lentilhas de água, a Anubias nana, a Ceratopteris e a Salvinia. Outras plantas menos utilizadas mas nem por isso menos úteis incluem Géneros como o Miriophilum, Elodea, Riccia, Valisneria e Sagittaria. Para meios de postura podem-se incluir, além das plantas aquáticas, turfa, quer finamente dividida quer um fibra e ninhos artificiais, submersos e flutuantes, em fibra acrílica. Estes ninhos artificiais, que tenho experimentado com êxito para peixes que costumam desovar em plantas à superfície (Epiplatys), têm grandes vantagens, nomeadamente a sua fácil limpeza, a sua longa durabilidade sem se desfazerem, a facilidade de detecção dos ovos depositados (principalmente se as fibras forem escuras) e a inércia química, dado que não alteram nem o pH, nem a dureza da água.

Finalmente o aquário típico de Killies deverá incluir arejamento com uma bomba de ar e uma lâmpada fluorescente. No caso de killies saltadores (Epiplatys, Aphyosemion e outros) é conveniente tapar todas as hipóteses de saída do aquário. Uma pequena abertura pode levar à perda irreversível das nossas "jóias vivas".

Na manutenção correcta dos killies exige-se que sejam feitas mudanças parciais da água do aquário (1/4 do volume por semana no caso de killies não anuais, ½ do volume por semana no caso de killies anuais, de metabolismo e crescimento muito rápido, tais como os Nothobranchius e Cynolebias, entre outros).

A alimentação habitual dos killies deverá ser o mais variada possível e, de preferência, viva: larvas de mosquito vermelha, negra e branca, daphnias, artémia salina, vermes Grindal, microvermes, drosófilas ou moscas do vinagre e da fruta, minhocas e tubifex. Na impossibilidade de utilizar estes alimentos vivos, então dever-se-á recorrer à comida congelada. Alguns alimentos podem ser preparados pelos killiófilos nomeadamente o baço, o coração de vaca, o fígado de vitela ou de frango e o mexilhão.

Alberto Reis

 

Material Cedido Pela Associação Portuguesa de Killifilia

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